quinta-feira, 29 de agosto de 2013

QTMD - Com a cara e a coragem


Com a cara e a coragem Por Thiago Andrade(*)

Quem usa máscara não tem coragem de mudar um país de verdade. Porque haveria receio de mostrar seu rosto? Medo de ser identificado? Que revolucionários são esses que, de repente, brotaram das redes sociais? Vejo muitos de meus conhecidos, boa parte deles com pensamento de direita, outros que dizem defender o anarquismo, defenderem o direito de se manifestar. Porém, minha grande curiosidade é: contra o que protestam mesmo? Dizem querer o fim dos escândalos de corrupção, e, ainda, melhoras na saúde e na educação.

Ocorre que os manifestantes precisam saber de duas coisas. Por um lado, para que se possa mudar realmente uma sociedade, especialmente um país do tamanho do Brasil, faz-se necessário articulação política (palavra tão odiada por alguns), o que só se consegue através de movimentos sociais que tenham lideranças para que se possa coordenar e direcionar suas demandas, sem o quê qualquer grupo de pessoas na rua se transformaria apenas numa massa potencialmente violenta, mas sem capacidade de articulação, e destoante do ponto de vista ideológico e político.

A necessidade de dialogar com o poder instituído é intransponível para qualquer movimento social que busque colocar em prática suas ideias de governo e de estado, ou do que seriam reais políticas públicas. Para que haja articulação social é indispensável tempo para que os grupos sociais sejam organizados e coordenados. Não vislumbro essa coordenação nos indivíduos que estão participando ativamente dos recentes protestos, tampouco me parece haver organizações sociais sólidas atuando por trás destes indivíduos. Grupos como o Anonymous, propagandeados pelas redes sociais, não tem qualquer base social no Brasil, e não sabemos em nome de que interesses políticos atuam.

Por outro lado, se o que buscam os manifestantes é um pais totalmente livre de corrupção ou de desvios de recursos públicos, sinto informá-los que, apesar de louvável, tal objetivo ainda não foi atingido por qualquer país na história. O ser humano, assim como as instituições políticas por ele criadas, carregam em seu âmago a imperfeição, e o fato de ser corruptível está incluído nesse contexto: observamos isso, inclusive, em agrupamentos humanos menores, como, por exemplo, em uma família, quando um irmão pega o biscoito de outro que estava num canto da geladeira e, ao ser questionado, desmente; ou quando um filho furta dinheiro da carteira de sua mãe.

Temos que, sim, fortalecer as instituições responsáveis por fiscalizar os organismos estatais, com o objetivo de desnudar possíveis esquemas de locupletamento ilícito ou malversação de dinheiro público.
Já se sabe que, durante períodos de regime militar muito se desviou de recursos públicos, porém, na época, a população permaneceu ignorante aos desvios, pois a censura sobre os veículos de comunicação junto ao rígido controle sobre os órgãos públicos que deveriam fiscalizar o governo não permitiram o desnudamento dos esquemas de corrupção.

Devemos relembrar que já conquistamos enormes avanços nas últimas décadas, tanto em liberdades políticas quanto na área social. E mais, não podemos achar que vamos mudar o país apenas através de fotos de cartazes publicadas em redes sociais. Neste sentido, grandes manifestações necessitam de um desígnio minimamente conectado com a realidade social de seu país, para que não se tornem apenas um meio de uma numerosa minoria demonstrar poder de persuasão política, na contramão da liberdade de locomoção da maioria da população e, ainda, da liberdade de opinião. Pois, como disse Cynara Menezes, protestar contra tudo é o mesmo que protestar contra nada.

*Thiago Andrade é formado em Direito e trabalha como Técnico do Ministério Público de Pernambuco. Passa, a partir de hoje, a ser colaborador permanente do QTMD?

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