segunda-feira, 27 de junho de 2011

Competitividade na escola é criticada

  Ambiente escolar voltado apenas para resultado de vestibular desestimula aprendizado, defende educadora em artigo na 'Science'.


Um ambiente escolar extremamente competitivo - e voltado para testes de ingresso na universidade - está prejudicando a vida de muita gente. O diagnóstico não partiu de educadores indulgentes ou de adolescentes preguiçosos: mereceu um editorial da prestigiosa revista Science, publicação da Associação Americana para o Avanço da Ciência.

A autora, Deborah Stipek, da Faculdade de Educação da Universidade Stanford, em Palo Alto, na Califórnia, estuda a motivação dos jovens no ambiente escolar há 35 anos. Na terça-feira passada, em uma entrevista, ela recordou o dia em que a sua filha chegou em casa, comemorando: "Nunca mais vou estudar francês." A garota tinha acabado de fazer uma prova que a auxiliaria a concorrer a uma vaga no sistema de ensino superior americano. "Ficou claro que não estava interessada em dialogar com outras culturas, em viajar ou em adquirir uma habilidade útil para a vida", pondera Deborah.

Para a pesquisadora de Stanford, os jovens são treinados para obter um excelente desempenho em testes de múltipla escolha. Também são animados a enfeitar seu incipiente currículo com atividades esportivas ou cívicas que rendam um perfil atraente aos olhos das principais universidades dos Estados Unidos, como Harvard, Colúmbia, a própria Stanford. Nada contra o desempenho extraordinário nos exames ou contra atividades fora das quatro paredes da sala de aula. Mas Deborah aponta que há algo de aberrante na educação focada em resultados mensuráveis, currículos e rankings.

Segundo ela, em nome da eficácia administrativa da preparação para os exames, sufocam-se, por exemplo, a alegria do aprendizado, uma visão construtiva dos próprios erros e a formação de uma personalidade madura e equilibrada.

Um sistema racional - pois ninguém pode negar que atinge seu objetivo principal: produzir especialistas em provas -, mas pouco razoável. Afinal, "prejudica vidas que poderiam ser promissoras de outra forma", como afirma textualmente o editorial.

Filme. A autora não esconde sua fonte de inspiração: um documentário lançado há um ano nos Estados Unidos, em que ela mesma foi entrevistada. O título do editorial na Science ("Educação não é uma corrida") representa uma clara referência ao título do documentário: Corrida para Lugar Nenhum.

A obra cinematográfica não está sendo exibida nas grandes salas - apesar do interesse das distribuidoras -, mas em escolas, universidades e igrejas. Depois das sessões, é comum que se organizem discussões públicas.

A ideia do documentário, ainda pouco conhecido no Brasil, partiu de Vicki Abeles, uma advogada sem experiência com câmeras. Ela percebeu na filha o efeito do estresse escolar e decidiu registrar sua visão do problema.

A obra lhe rendeu certa notoriedade. Foi ao programa de entrevistas de Oprah Winfrey, na TV americana. Também visitou o presidente americano Barack Obama, na Casa Branca.

Soluções - Para Deborah, não bastariam mudanças pontuais. Seria necessário alterar o modo como funcionam universidades, colégios e até mesmo famílias. A coordenadora do Centro de Pesquisas sobre a Infância e a Adolescência da Unesp de Araraquara, Maria Beatriz de Oliveira, concorda. "A situação descrita pelo editorial da Science se aplica perfeitamente à realidade brasileira dos vestibulares", afirma a psicopedagoga.

"Normalmente, a pressão mais forte ocorre dentro de casa", aponta Maria Beatriz. Alguns pais criam um sonho para o futuro dos filhos e pretendem realizá-lo a qualquer custo. "Passei as últimas duas décadas explicando para pais que seus filhos não terão fracassado se não passarem no vestibular concorrido de certas universidades."

"Sucesso na vida não requer um diploma em uma das dez universidades (de maior prestígio)", confirma Deborah. "Precisamos ensinar aos pais a vantagem de um rol maior de universidades na sua lista de opções."

Ver a educação como um produto, e não como um processo, seria a raiz dos males, segundo Maria Beatriz. "Você deixa de olhar para o bem da pessoa concreta e começa a se preocupar só com resultados", aponta.
(O Estado de São Paulo - 26/6)

GILBERTO DIMENSTEIN - O sucesso dos fracassados

in Folha de São Paulo

Crianças que conseguem lidar melhor com a frustração tendem a ter sucesso e bons empregos



O BOM DESEMPENHO acadêmico e profissional está menos ligado à inteligência do que ao autocontrole, isto é, à habilidade de gerenciar os impulsos, focar o que é relevante e perseverar.
Esse assunto vai entrar na agenda mundial em razão da recente divulgação de pesquisas que, feitas por psicólogos e neurocientistas de algumas das melhores universidades americanas, vêm ganhando credibilidade entre especialistas em aprendizagem.
Crianças que conseguem lidar melhor com a frustração e com o fracasso tendem a obter bons empregos, a ter sucesso em negócios, a economizar dinheiro, a cuidar da saúde e a ficar distantes de vícios.
Além disso, é claro, elas tendem a ter melhor desempenho escolar. Ficar sentado estudando, afinal, é tarefa que exige que, apostando numa recompensa futura, se deixe de fazer algo mais agradável.
É possível aprender a ter autocontrole? É o que algumas escolas nos Estados Unidos estão experimentando com crianças a partir dos três anos de idade. Os resultados, pelo menos nas notas, têm sido positivos.


 

As pesquisas vêm sendo feitas desde a década de 1970, quando, na Universidade Stanford, começaram a acompanhar crianças que demonstravam, em experimentos, saber controlar os impulsos.
Numa das experiências, puseram um chocolate diante de cada criança de um grupo de testes. Aquelas que não comessem nada ganhariam, mais tarde, três chocolates. Acompanhou-se por décadas esse grupo, comparando o desempenho dos seus integrantes nas mais variadas atividades. Observou-se que quem sabe se controlar obtém vantagens acadêmicas, ou seja, boas notas.
No mês passado, a psicóloga Terrie Moffitt, professora da Duke (EUA), um dos mais importantes centros de neurociências do mundo, divulgou um estudo baseado em 30 anos de observação. Foi além das revelações sobre as notas dos alunos. "Há um impacto generalizado nas mais diferentes áreas, inclusive na taxa de criminalidade", afirma.


 

Ela acompanhou 1.037 pessoas desde a primeira infância até os 32 anos de idade. Resultado semelhante ocorreu em suas pesquisas com gêmeos. "Vimos que o autocontrole, depois de descontados fatores como renda e classe social, superou a inteligência como elemento desencadeador de sucesso no universo acadêmico e no profissional."
A pergunta óbvia: a habilidade de controlar os impulsos é algo genético? A psicóloga diz que, em parte, ela decorre de herança genética, mas que também há influência do ambiente, como a família e a escola.
Por isso algumas escolas estão criando jogos destinados a desenvolver o autocontrole. Um dos jogos usa peças de teatro para que as crianças aprendam a executar papéis. Esse é um recurso em meio a diversos tipos de brincadeira, cuja recompensa está associada à capacidade de lidar com a frustração e de postergar alguma decisão. Estimula-se, assim, a capacidade de encontrar soluções para desafios.


 

Tenho visto aqui na escola de negócio de Harvard vários professores repetirem o seguinte: bom empreendedor é aquele que sabe fracassar, fazendo dessa experiência uma motivação e um aprendizado. "Fracasso é uma medalha a ser colocada com destaque no currículo", diz Rosabeth Kanter, professora da escola de negócios de Harvard e mundialmente renomada por seus perfis de empreendedores.
Talvez esteja aí um jeito de entender melhor por que migrantes e seus filhos -obrigados a lidar com adversidades e frustrações, desenvolvendo a resiliência- tendem a prosperar e por que cidades mais abertas a imigrantes são mais inovadoras e empreendedoras.


 
PS- Até acho que as pesquisas sobre autocontrole fazem muito sentido. Saber trabalhar as limitações e frustrações é essencial para manter a garra. Meu receio é o modo como isso se traduz na prática. Tenho visto muitos pais e educadores reduzirem o espaço da brincadeira, importante para a imaginação

segunda-feira, 20 de junho de 2011

sorriso

“Por que você diz que no Japão não há democracia?”, perguntava-lhes ao novelista Kenzaburo Oé. 

 “Pelo sorriso do primeiro ministro”. 

Os conspiradores, os violadores, os pedófilos, os caudilhos sorriem precisamente assim. Nos roubaram até a pureza dos sorrisos.