Orgasmo Masculino Fake: o Desejo X a Culpa
Há alguns dias eu recebi um desafio.
Sim, teve uma reunião das Bisca que decidiram me interpelar brutalmente
(DM no Twitter, com twit de “@Mozzein —>DM”) para que eu falasse de
um tema complicado para nós, homens: orgasmo fingido, broxada. A ideia
era aproveitar as discussões resultantes do post “Orgasmos: é à brinca ou é à vera?”
da Renata Lins e da Silvia Sales e preparar um dedo na nossa ferida… (O
post foi tão bom que rendeu a homenagem do Matheus, confira aqui)
e fiquem calmos, o dedo vai só na ferida mesmo. Como eu sou muito
#FACINHO, aceitei imediatamente, pois, já que eu estou fazendo hora e
fazendo fila na vila do meio-dia, não custa nada me coçar, me roçar e me
viciar na biscatagi…
A questão principal é HOMEM FINGE ORGASMOS? Como isso poderia acontecer? Há quem diga que homem só broxa e que fingir orgasmos é coisa de mulher… pê-pê-pê, pá-pá-pá, sexismos etc. e tal. Só digo uma coisa pra vocês, dispam-se disso. Homem finge orgasmo sim. Vamos pensar em conjuntos, em inter-relações e em trocas para tentar entender isso… se eu abusar do sociologês, pode bocejar e continuar lendo, mas vamos lá.
Primeiro, sexo e orgasmo (heterossexual e
homossexual) é algo que se descobre a dois. Não existe uma receita.
Existe prática, conhecimento do outro, cumplicidade. Pode rolar de
primeira, delícia que sempre seja assim, mas se não rolar (e, pior, se
não está rolando) é importante se conhecer. Colocar o nariz, a língua, o
dedo, a boca, usar de todos os artifícios que o nosso corpo permite (e
que não o “destrua”) para aproveitá-lo, na plenitude.
Outra coisa é o autoconhecimento. Não
adianta querer meter o dedo (y otras cositas más) no outro se não
sabemos onde o outro pode colocar na gente. “SE TOQUEM”, sempre digo
isso! (aliás, se você não leu, veja lá a situação do Gerônimo!)
É preciso que as pessoas pratiquemos isso! Como pretendemos ter algum
tipo de prazer sexual, despejar o gozo do nosso desejo (que envolve 2
partes, o psicológico e o somático, a mente e o corpo) se, no mais
simples, no nosso corpo, nos recusam a nos TOCAR??? Irrita-me,
profundamente, quando escuto certos discursos que, muitas vezes
veladamente, condenam o autoconhecimento. Pior, que condenam o
reconhecimento do próprio corpo como um elemento de satisfação.
Sim, o nosso corpo é um elemento da nossa
satisfação. Ninguém está aí para ser a satisfação do outro (o nome
disso é estupro, físico ou cultural, sim, se você finge o orgasmo você
pode estar sendo culturalmente estuprado). E o bom é que se alcance a
satisfação com o outro, juntos, senão não serve. Pra isso, há uma
terceira questão: A CULPA. Sim, essa senhora é o algoz de todo o DESEJO.
CULPA, CUL-PA, C-U-L-P-A. Pessoal, familiar, social, ou cultural, a
culpa é o motivo de muitos orgasmos fingidos. É a culpa de ser gordo em
uma sociedade magra, de ser feio em uma sociedade linda, de ser
raquítico em uma sociedade atlética, de transpirar em uma sociedade
anti-transpirate. Mas esse é só o primeiro nível de culpa, pois envolve
apenas aspectos fisiológicos.
Outro nível é a culpa de gozar. Não só de
gozar, mas de se permitir fazer sexo. É a dos jovens de pais
repressivos, dos homossexuais de pais homofóbicos, dos religiosos de
seitas que pregam a suma reprodução, dos diferentes que sofrem com os
dedos apontados pelos iguais. Haja Freud! Se encaixou em alguma delas?
Pois é, é aí que começa o fingimento do seu, do meu, do nosso orgasmo,
querido leitor-leitora biscate-wanna-be. Sim, isso serve para as
meninas.
Isso tudo me traz à cabeça Clarice
Lispector no “Uma aprendizagem, ou o Livro dos Prazeres”, que conta o
processo de emancipação sexual de Lóri, levado a cabo por Ulisses. Não
vou entrar em detalhes sobre a história (cuja leitura, mais que
recomendo), me interessa a questão da emancipação que, no caso, ocorreu
pelo fato de que alguém que exercia um papel de dominância (Ulisses)
resolveu permitir ao outro, que queria e buscava isso, um processo de
liberação.
O processo de aprendizagem é algo
difícil, doloroso e, em certo ponto, pende entre alienante e
emancipatório (a Lóri passa por esses estágios). Já diria meu querido
Bourdieu (mais especificamente sobre a escola) que a reprodução de um
sistema de dominação (e, sim, educação sexual da culpa é uma das mais
fatais em nossas vidas) é principal motor de um “sistema de alienação”.
Cabe, assim, a todos nós dominadores ou dominados, ou dominados em
conjunto. Trabalhar pela nossa emancipação.
Todo processo de aprendizagem é um
processo de dominação. Há sempre o que diz (ou faz) e os que reconhecem
que aquilo o que é dito (ou feito) é “bom” (ou “ontologicamente melhor”,
pra usar o Bourdieu). Sem querer reduzir a questão sexual apenas à
questão simbólica do poder, cabe a quem domina, a quem tem o
reconhecimento, decidir sobre exercer seu poder para emancipar, ou
praticar a violência e alienar. E cabe ao dominado buscar ver o processo
por cima, de forma crítica e entender a intenção do seu dominador. O
mundo pode até ser dos sensíveis, mas não é dos ingênuos… infelizmente!
E não se enganem, alienação sexual é
também uma escolha e é NOSSA. Pelo simples fato de que somos nós que
reconhecemos nesse sistema a suas capacidades de nos dizer o que é certo
ou errado sexualmente. Mas não é só isso, felizmente. Não é comum, mas
vira e volta surge um desses “dominadores” (no sentido de detentores de
poder/conhecimento/reconhecimento e não de repressores) que resolvem se
permitir conosco modificar essa situação e, aí, acontece a reversão da
dominação. Afinal, o que seria de nós sem os pais responsavelmente
permissivos, os professores avant garde, os meios de comunicação libertários, os movimentos pelas liberdades, os psicólogos e psicanalistas.
Onde fica o orgasmo masculino fingido
nessa história? Fica principalmente nessa culpa decorrente do nosso
processo de alienação sexual. O homem não finge o orgasmo pela ausência
de uma regularidade fisiológica, a impotência. Fingir o orgasmo não tem
nada a ver com isso, aliás, precisamos estar em riste para poder fingir
algo que não vai ocorrer. É justamente nas questões de autoconhecimento e
de culpa que reside o nosso momento #FAKE.
É assim: Veio a vontade, começamos a
trepar, mas o parceiro gemia esquisito; a foda estava mal dada, entrou
atravessado; colocaram a mão no lugar errado, ou não colocaram a mão em
lugar nenhum; conversou muito, conversou pouco; a culpa afligiu o
desejo… era suor demais, gordura demais, ossos demais, dente torto
demais, mau cheiro e sangue demais; as vezes o tesão nem era tão grande e
só pegamos para mostrarmos que éramos homenzinhos; pegou menina e
gostava de menino; era a voz da mãe, do pai, da avó, do pastor, do
padre, do professor, ou da vizinha que não saía da cabeça; ou, ainda, o
mais simples e digno, o cansaço era maior.
E aí, assim, metemos, beleza. Rolou um
vap-vap-vap. Mas não tava lá essas coisas. Aí, atire a primeira pedra
que nunca pensou na mãe morta, no cachorro atropelado, na vizinha velha
nua, ou simplesmente broxou (e volto a dizer, não é algo somático, não é
impotência, é psicológico, é falta de vontade, de desejo), por ter
escutado lá dentro, no inconsciente, a voz de algum repressor. Então, é
só dar um urro e não deixar a falta de conteúdo dentro da camisinha à
mostra. Pronto, está feito um orgasmo masculino fingido. Acontece, pode
até não ser comum, mas não é raro. O que faz com que ele ocorra? São
motivos mil, incontáveis, a maioria dependente da ambivalência
Desejo-Culpa. Não deixe acontecer mais com você. LIVRE-SE DA CULPA!
Só pra lembrar, vale ver o vídeo em que
Sean Maguire (personagem do Robim Willian) lembra a Will Hunting
(personagem de Matt Damon) que “NÃO É SUA CULPA”, no filme Gênio
Indomável. GOZE!
Publicado em biscatagi especial, desejos de biscate, uma biscate quer
Com a tag augusto mozine, autonomia, biscatagi especial, corpo, desejo, liberdade, orgasmo, prazer, sexo
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