segunda-feira, 1 de julho de 2013

O perfil dos manifestantes no Facebook - Eliseu Barreira Junior


http://ideas.scup.com/pt/o-monitor/o-perfil-dos-manifestantes-no-facebook/
O perfil dos manifestantes no Facebook
OLHAR DA SEMANA, por Eliseu Barreira Junior

Quem são, o que curtem e quais ídolos admiram os usuários do Facebook que mais falaram dos protestos que mobilizaram o Brasil


O usuário do Facebook que protestou na rede social nas últimas semanas é homem, tem entre 20 e 29 anos e vive em São Paulo. Gosta de ouvir Adele e rock, lê a Bíblia tanto quanto as histórias fantásticas de O senhor dos anéis e assiste a filmes de ação como Star Wars e Avatar. Quando vê TV, fica dividido entre o humor dos programas Os Simpsons, CQC e Pânico. Crítico aos gastos com a Copa das Confederações, curte futebol e torce, principalmente, para o Corinthians. Seus atletas preferidos são Anderson Silva, Ayrton Senna e Kaká. Se precisa de inspiração, recorre às lições de figuras cristãs, budistas e espíritas.

Traçado numa análise exclusiva a partir dos dados coletados pelo monitoramento público do Scup, esse perfil reflete traços marcantes do brasileiro médio e mostra interesses de uma juventude que se alimenta de símbolos pop para mudar o país. O estudo, feito com os “likes” dos 3600 usuários que mais falaram dos protestos no Facebook entre os dias 13 e 27 de junho, traz alguns insights interessantes.

Primeiro, o sincretismo religioso fincou raízes fortes em nossa sociedade. Os manifestantes têm como modelo Jesus Cristo, Mahatma Gandhi e Chico Xavier – os gênios Albert Einstein e Steve Jobs completam o panteão dos cinco mais inspiradores.

Segundo, gente como Karl Marx e Che Guevara, que fez a cabeça de uma geração de revolucionários, apesar de lembrada, não motiva mais como antigamente. Nelson Mandela, Clarice Lispector e Martin Luther King Jr vêm à frente deles. Parece que as conquistas práticas de Mandela e King são mais digeríveis pelos manifestantes do que as utopias de Marx e Che.

Terceiro, o rock é o estilo de música que domina o dia a dia dos manifestantes. Dos 15 artistas e bandas identificados, 10 se enquadram nessa categoria. Os mais destacados são Beatles, Legião Urbana e Coldplay. Bem que a letra de “Que país é esse?”, do Legião, poderia ser eleita o hino dos manifestantes: “Nas favelas, no Senado / Sujeira pra todo lado / Ninguém respeita a Constituição / Mas todos acreditam no futuro da nação / Que país é esse? / Que país é esse? / Que país é esse?”.

Quarto, diversos elementos da cultura pop despertam o interesse de quem decidiu protestar “contra tudo” nas últimas semanas. Star Wars, Piratas do Caribe, Shrek e o corajoso bruxinho Harry Potter compõem a lista. O que há em comum entre essas histórias? A luta entre o bem e o mal e anti-heróis. Nos protestos de rua que vimos, partidos, políticos e instituições seriam o mal; o personagem Guy Fawkes, representado nas diversas máscaras usadas pelos manifestantes, simbolizaria o anti-herói justiceiro.

Por fim, entre os livros, chama a atenção o gosto pela Bíblia e O pequeno príncipe. Recém-completados 70 anos, O pequeno príncipe, do francês Antoine de Saint-Exupéry, é considerado um livro existencialista que narra “o reencontro do adulto com o olhar perdido de criança e também o encontro da criança com questões da vida adulta”, nas palavras da professora de literatura da Universidade de São Paulo (USP) Verónica Galíndez Jorge. Parece que os jovens brasileiros cresceram e não curtiram muito a realidade com que se depararam.

Como é possível observar, estudos feitos a partir dos “likes” de usuários do Facebook permitem diferentes interpretações psicológicas sobre quem – e o quê – está por trás de um fenômeno social. Enquanto pesquisas tradicionais ficam restritas a informações de escolaridade, idade, sexo e filiação partidária, por exemplo, a análise dos gostos e interesses compartilhados publicamente na rede ajudam a construir um perfil mais profundo e complexo de camadas da sociedade. As diversas “pegadas” que deixamos no universo digital carregam referências e hábitos culturais valiosos para acadêmicos, governantes e profissionais de marketing.

A tendência é que análises do tipo ganhem cada vez mais espaço nos próximos anos. Seu avanço dependerá do desenvolvimento de tecnologias capazes de ajudar na extração dessas informações. A funcionalidade do Scup que usamos para produzir o estudo está em fase de testes e deverá ser disponibilizada para o mercado nos próximos meses. Por enquanto, é possível obter análises assim na ferramenta a partir de e-mails associados a perfis sociais públicos. A nova tecnologia que está sendo desenvolvida dispensará a necessidade do e-mail.

COLABORARAM Claudia Gasparini, Lucas Moschione e Santiago Oliveira

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