Depois de Lúcia: os culpados somos nós
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Nesta semana fui assistir ao tão esperado Depois de Lúcia
e posso dizer que todas as críticas que li sobre a crueldade da
violência explicitada no filme não é capaz de traduzir o que eu vi ali
na minha frente. O que eu mais li sobre o filme e, de fato, a violência
que está mais explícita é a do bullying. E isso é mais do que certo. Mas
acho que há outro ponto primordial a ser discutido e levantado: a
violência de gênero que sofre a personagem.
Alejandra é uma adolescente que se muda
com o pai para a Cidade do México depois que sua mãe, Lúcia, morre. Na
nova escola ela faz novos amigos e aceita o convite de passar o fim de
semana na casa de um deles com toda a turma. É aí que sua vida se
transforma num inferno.
Sempre que penso em bullying – e aqui a
ignorância é toda minha –, penso na vítima como a criança gordinha ou o
nerd. O adolescente negro ou homossexual. A aluna travesti ou trans*.
Nunca pensei na vítima como uma jovem bonita, de classe média, branca,
heterossexual, cis*, magra. E aí que Alejandra é tudo isso e nunca passou pela minha cabeça que seria ela a vítima do bullying.
Mas Alejandra é vítima e eu me esqueci
por um segundo que ela tem, sim, potencial pra ser vítima. Ela é mulher e
uma mulher que faz sexo. Eis o ponto crucial no filme.
Uma adolescente que faz sexo se torna
vítima de bullying. Faz dela um ser anormal, passível de sofrer as
maiores atrocidades. A desumanização de Alejandra por parte de seus
amigos/algozes é rápida. É pelas mãos daqueles garotos e garotas que ela
acreditava ter sido acolhida em uma cidade estranha, que Alejandra vai
apanhar, ser estuprada, ser despojada de sua humanidade e tratada como
uma coisa qualquer. Por todos.
O que me pareceu mais intrigante no
filme é a narrativa que nos mostra que, em atos extremos de violência,
todos nós temos nossa parcela de culpa: o grupo de amigos, entre os que
tomavam a frente nas “brincadeiras” e os que iam na onda; a escola
omissa; o pai envolvido com seus próprios problemas; e você. Você, que
foi despretensiosamente ao cinema, é cúmplice da violência contra
Alejandra. E de tantas outras meninas e mulheres.