Institucionalidades
As músicas dizem muito sobre como
pensamos a vida. As músicas expressam, às vezes, aquilo que estamos
dispostos a dizer, mas não dispostos a tornar imperativo, aquilo que é
necessário ficar no imaginário, sem ser objeto de intervenção. Não só a
música, eu sei, é um propósito da arte, não toda, mas de alguma. A
institucionalidade, ao contrário, nos obriga.
Exato, a institucionalidade, a esfera da
exclusão do que é belo, por definição. Como boa Bisca que sou, tenho
minhas teorias sobre a institucionalidade. A principal delas, é que as
pessoas não só esperam por isso, como clamam, imploram e se submetem. A
institucionalidade é, em si, a representação documentada da condição de
ser… É a própria submissão à condição de estatística.
Mascarada como legitimidade, a
institucionalidade é a forma como a nossa sociedade conseguiu, sem ao
menos tentar, praticar a fraternidade. Sim, a fraternidade, aquela bela
forma de reconhecer no outro os mesmos direitos, as mesmas liberdades,
as mesmas possibilidade de dançar, à sua maneira, a mesma música que
dançamos… A institucionalidade, em forma de lei, de decisão jurídica, de
ordem de autoridade, é a nossa declaração de absoluta incompetência
para viver com o outro, de conviver com o outro.
Sim, estou culpando o resultado por sua
causa… Anarquia? Talvez… Por que não? A busca incessante que vivemos
hoje pela satisfação de direitos através da lei é o resultado desse
processo de institucionalização da vida… Bato nessa tecla, estamos
passando da esfera do “livres para fazer o que não é proibido” (seria
melhor livres para fazer o que não afete a liberdade alheia) para a do
“livres para fazer o que a lei manda” (no melhor dos casos). Estamos
invertendo tudo.
Desculpem a visão utópica. Do entender a
marcha das minorias (e alguns excluídos nem minorias são) pela
institucionalização de direitos, a concordar que isso é a única forma de
se fazer respeitar as diversas condições, me falta a vontade. Me perco,
às vezes… simplesmente não registro o quê de liberdade que há nisso. É
como se a minha música tocasse não para ser ouvida, mas para ser
registrada, não para ser dançada, mas para ser marchada, não para ser
sublime, mas para ser verdade.
Assim, eu não queria… Mas, pelo jeito,
por uma infortuna “formação cultural” o que tem pra hoje é um processo
amplo, geral e restrito de institucionalização. No qual ao invés de se
reivindicar direito, reivindica-se legalizações. Vivemos num país onde o
se educar em conjunto, tornou-se um vamos fazer valer “isso” para que
as pessoas, então, aprendam. Perdemos o bonde do processo de
socialização… deixamos de significar as relações sociais para criar
instituições, caixinhas mais confortáveis onde as pessoas possam dormir
melhor…
Assim eu não queria… Mas se o jeito,
hoje, é lutar para que as pessoas institucionalizem sua condição social,
sua cor, sua sexualidade, sua identidade de gênero, não vou fechar os
olhos e deixar acontecer, meu jeito é lutar junto. Lutar junto, contudo,
para lutar mais. Lutar é a única forma de se posicionar pela igualdade,
pela alteridade! Ser intransigente, se preciso, na minha opinião e
combater o conformismo, sempre! É assim, virarei estatística, se
preciso, pra defender o direito ao reconhecimento, sobretudo pra
defender minha utopia de não ter que institucionalizar o que sou, sou
livre, sou música, sou dança, sou a arte de uma vida de histórias e
sentimentos, não caibo em definições…